domingo, 2 de novembro de 2008

3 de Novembro - 6.º Dia

Às 6h20 da manhã já me encontrava no ponto de encontro acordado com a Avital. Eram perto das 6h30 quando o carro da Avital parou ao pé de mim. Ao seu lado vinha outro membro que me foi apresentado como sendo Shosh Holper. Feitas as apresentações seguimos caminho para a primeira paragem da manhã. Parámos em Anata cerca das 6h50 e mantivemos nos lá até às 7h15. Anata é um posto de controlo para veículos entre bairros de indivíduos que não são israelitas, nem são palestinianos, encontram-se no meio dos dois povos. Todos os carros e as pessoas que passam a pé têm que ter um livre-trânsito verde, caso contrário, não poderão passar. A maioria que passava a pé eram crianças que depois do posto de controlo apanhavam os autocarros para a escola. Segundo Avital, hoje não se viam muitas crianças porque muitías não deveriam ter aulas ao domingo, porque durante a semana, são bastantes as que têm que passar pelo extenso corredor feito de barras metálicas e tendo como tecto arame farpado.
Os carros tinham que parar todos mostrar o livre-trânsito e o carro era revistado, tinham que abrir o porta-bagagens e só depois poderiam partir. Os autocarros eram inspeccionados com bastante cuidado, se traziam passageiros tinham que sair mostrar os livre trânsitos e o autocarro inspeccionado, só depois poderiam entrar e seguir viagem. Apesar de haver duas únicas filas, encontravam-se dispostos 3 militares por fila, um mais adiantado a inspeccionar carros mais afastado do posto de controlo, e outros dois junto ao posto de controlo, a inspeccionar outros veículos. Assim conseguiam inspeccionar 2 veículos por fila, porque dois soldados estavam só presentes para ver se as coisas corriam bem. Após, o posto de controlo, estavam mais 3 militares e um segurança civil armado (contratados pelos militares). Era curioso ver num único sítio 4 forças armadas, diferentes: militares, polícia, polícia militar e seguranças civis armados, Distinguem-se pela cor do facto e insígnias à excepção do milicianos que usam roupa normal com coletes à prova de bala.
Não foram detectados problemas. Entretanto Avital mostrou-me a diferença que existia entre o lado de lá do posto de controlo e o lado oposto ocupado pelos colonos. De um lado o "luxo", limpeza acompanhado de árvores e flores. Do outro o lixo acumulado no chão, o arame farpado, terras desérticas sem vegetação, e casas bastante degradadas. Senti que existia entre os membros da Machsom Watch e os colonos um clima de ódio. Os colonos são considerados como parasitas e os grandes causadores de grande parte dos problemas que existem. Estávamos a conversar até que olhámos para uma manobra de 4 mulheres que não tinham livre-trânsito para passar então puseram-se ao lado de um dos autocarros e andavam consoante o autocarro, como os militares estavam do lado contrário passavam despercebidas. Presenciámos a situação pensando que conseguiriam levar a avante a tentativa de passagem. Mas saiu frustrada, porque a pós passarem o posto de controlo o autocarro desviou-se um pouco para a direita e elas saíram cedo demais da sua protecção. No mesmo momento que o soldado mais avançado se virava para o sítio onde estava o autocarro (por acaso, porque ele não estava a contar) quando as viu começou a gritar para pararem e a correr na sua direcção, entretanto os outros militares empunharam as armas e viraram-se para o local. As senhoras, após terem sido detectadas começaram a voltar para trás por livre vontade, nenhuma força foi aplicada. Sholsh virou-se para os guardas e disse-lhes porque não as tinham deixado ir, elas já estavam do lado de lá do posto de controlo, os militares riam-se (como a gozar) e Sholsh disse-lhes que realmente tinham muita piada, eles olharam para ela e calaram-se.
Explicaram-me que eram mulheres de aldeias que não tinham os papéis porque não tinham direito a eles.
Ficámos mais um pouco, como tudo estava a correr na normalidade, decidiram ir para outros postos de controlo.
Seguimos viagem para o posto de controlo de A-Ram. A-Ram é uma cidade dividida por um muro alto de betão e arame farpado que separa a parte israelita e ocupadas pelos colonos e a parte palestiniana. Também aí tivemos pouco tempo, tudo estava a correr na normalidade. Pusemo-nos em movimento então para a paragem final, Kalandia. Foi-me explicado que Kalandia era o maior posto de controlo em Jerusalem, mesmo maior do que Bethlehem. Quando chegámos a Kalandia, fiquei um pouco confuso, pois porque passámos de carro o posto de controlo, e estacionámos no lado palestiniano. Explicaram-me que tínhamos entrado numa espécie de terra de ninguém, não era palestiniana, era israelita mas eles não queriam saber dela, era como uma zona de tampão, nem a limpeza faziam, bem isso notava-se bem.
Fomos então a caminho do posto de controlo propriamente dito. Quando entrei nem queria acreditar no que via. Parecia um hangar enorme, com centenas de pessoas, se não fossem mais do que um milhar, a empurrarem-se umas às outras, para ganhar vez nas filas.
Havia três portões. Em dois deles, as pessoas amontoavam-se mais para esses o outro estava mais vazia, mas mesmo assim contavam com umas boas dezenas de pessoas. Explicaram que aquele era designado como o corredor humanitário, usado exclusivamente por doentes a caminho do hospital, crianças e estudantes a caminho das escolas. Mas pouco tempo passou após a nossa chegada para as queixas começarem, parece que aquele portão, que em teoria teria que ter mis escoamento do que os outros ainda não tinha aberto às 7h35 da manhã. Avital pegou no telemóvel, e ligou para um dos responsáveis por aquele posto de controlo. Seis minutos depois o portão abrir-se-ia pela primeira vez, mas logo se fechou. Entretanto, por detrás de nós ouvia uma voz nos microfones a falar hebreu (mas que penso que era para dizer para mais alguns avançarem). Olhei, e pela primeira vez vi como aquilo se processava. Não queria acreditar no que via. Começavam a correr a empurrar uns aos outros dentro do túnel de grades e arame farpado em passo de corrida. Fez lembrar cenas de filmes do tempo da II guerra mundial quando os eleitos para serem mortos andavam para as câmaras de gás. A sério, senti-me um pouco mal, não fisicamente mas sim emocionalmente. Já tinha estado em outros, mas nada assim, quando os portões fechavam, os detrás continuavam a empurrar, os que estavam a frente por vezes quase que eram esmagados contra as grades. Isto só visto, porque não consigo descrever fielmente a realidade que presenciei. Estas imagens irão acompanhar-me durante algum tempo.
Entretanto começa a ouvir um alvoroço, e eram dois palestinianos que se tinham posto a lutar, presumo que deveria ser devido à posição nas filas, mas rapidamente a multidão conseguiu separá-los e tudo voltava ao estado anterior.
Entretanto Sholsh e Avital, oram telefonavam ora gritavam para o polícia graduado que lá estava, para pedir justificação do porquê do corredor humanitário estar muito mais lento do que os outros. Ao fim de cada telefonema de Avital, apercebia-me que o polícia recebia uma chamada e deixava passar mais uns quantos.
Olhava para aquela fila e via pessoas idosas que nem se conseguiam pôr de pé, crianças com ar de doentes e caras tristes que olhavam fixamente para mim. Algumas eram tão pequenas que me apetecia pegar nelas ao colo para tentar retirar-lhes aquele ar tão triste. Mas não quis interferir, por duas razões não quero interferir com a acção dos membros da organização e também nunca se sabe qual será a reacção dos familiares daquelas crianças, que olharam com desconfiança para tudo, o que é normal. Um ar que nunca saberei se era por estarem doentes ou se por terem que passar por toda aquela humilhação, sim porque para mim, considero que aquelas acções são feitas com o intuito de humilhar, só pode, não é possível poder-se agir assim com pessoas, principalmente com crianças. Sei que dirão que outros sítios serão bastantes piores, o que acredito, mas acreditem que é bem diferente ouvir-se falar ou ler sobre a situação ou ver-se ao vivo a real situação. Posso dizer que hoje costume estar a presenciar isto, sinceramente.
Tivemos lá até às 10h00, depois a Avital disse-me que tinha que levar umas pessoas (que ela trata por “família”) e que eu teria que apanhar o autocarro para a cidade. Respondi que sim. Só fiquei um pouco alarmado quando ela me disse que, não sabia se eu poderia passar com ela no carro no posto de controlo, porque só os israelitas o podiam fazer ou se os estrangeiros dentro de carros o poderiam também que fazer. Senão pudesse passar, teria que ir para ao pé dos outros e atravessar como todos os outros. Não gostei dessa parte, principalmente após o que tinha acabado de ver.
Entrei para o carro, e tentámos passar o posto de controlo, paramos elas identificaram-se, a Avital abriu o porta-bagagens e eu mostrei o meu passaporte a uma militar, verificou a validade do carimbo, entregou-me e mandou-nos seguir. Logo a seguir são do carro entra a “família” que já estava à espera e Avital indicou-me onde poderia apanhar o autocarro. Lá fui eu apanhar o autocarro para a cidade velha, para Damascus Gate.
Com a sorte eu tenho, o autocarro (que era um mini) estava cheio, fui junto à porta em pé. Durante a viagem começou-se a cheirar a queimado, o condutor pára o autocarro, manda sair toda a gente, como falou em hebreu não percebi se era a última paragem. Afinal era a consola ao lado volante que estava a deitar fumo, pouco depois mandou-nos entrar e segui-mos viagem, ele a conduzir com uma mão e com a outra a segurar a consola que nessa altura estava solta, ainda me ofereci para segurar mas ele disse que não era necessário. Acabámos por chegar, ao destino, aquilo já deitava fumo por todo o lado (eu realmente tenho bastante sorte).
Entrei por uma porta que nunca tinha entrado, na cidade velha. Conclusão ao início perdi-me, como era de esperar, sim porque as indicações em árabe e hebreu ajudam muito. Mas ao fim de algum tempo lá passei por sítios onde sabia que já tinha estado e aí foi fácil achar o caminho de volta (sempre tive uma boa orientação a partir da memória fotográfica de locais onde passo).
Chego ao hotel às 11h40, vou descansar um pouco e pôr o telemóvel a carregar. Às 12h20, saio vou comer e às 13h50 estou a apanhar o autocarro que me tinham indicado para ir ter ao local do encontro com a equipa da tarde.
Pergunto ao motorista se passa por Tantur ao qual ele respondeu que sim, pedi então um bilhete, ele pediu-me 224 NILs (cerca de 50 euros), questionei por duas vezes se era o bilhete correcto e porque era tão caro, disse que era aquele. Como tinha as coisas marcadas tive que pagar (mas custou-me bastante, nem sabem quanto). Bem olhava par o bilhete mas estava todo em hebreu e árabe (vou ter que ter uma conversa com o Yishay, sim porque ele sem me dise que tudo estava em inglês, não tinha que me preocupar, das duas uma ou ele não vem á já bastante tempo a Israel ou não é de Jerusalem que ele estava a falar.) Cheguei ao local, já fora de Jerusalem às 13h38, como o encontro era às 14h00 esperei à entrada da Tantur. Às 14h00 chegou um dos meus contactos. Apresentou-se como sendo Shlomit e disse-me que a Yael Shalem estava dentro da Tantur, tínhamos que a ir buscar. Fomos buscá-la e após me apresentar seguimos viagem para Bethlehem. Contei-lhes a minha aventura do preço do bilhete (estava atravessado no pescoço, 224 NILs), e elas perguntaram-me por é que eu tinha ido de táxi. Respondi que não tinha ido de táxi, tinha ido de autocarro, nº 18 como as indicações, disseram-me que era impossível esse preço, pediram-me para ver o bilhete, quando o viram disseram-me que me tinham vendido um bilhete mensal. O quê, perguntei eu? Desde quando é que se vende bilhetes mensais a turistas? (Realmente para trafulhas não estão nada mal) Então mostraram-me que lá estava escrito Novembro, e apontaram para o local. È pena eu não saber ler hebreu, fiquei fulo. Amanhã no tempo entre as duas visitas vou ver se e devolvem o dinheiro, duvido, mas tentar nunca custou nada. Durante a viagem fui explicando a plataforma como ela funcionava porque é que tínhamos adaptado a plataforma à organização delas, etc. Yael disse-me que para ela não era muito importante um sistema que recebesse informações do servidor. O que elas precisavam mesmo era de contactos por voz em tempo real e simultâneos (achei-a muito directa e sem rodeios, deveria ser por ser uma das veteranas da organização, e das terá mais conhecimentos sobre as acções a tomar no terreno).
Falei-lhe da conversa que tinha tido com a Ronny Perlman e com a Yehudit Elkana sobre essa questão. Entretanto chegámos ao destino: Matak Enzion, um posto onde os palestinianos têm que ir renovar o cartão electrónico para poderem ir trabalhar. Estavam lá bastantes palestinianos, alguns vieram ter com elas, porque sabiam que elas por vezes conseguiam por as coisas a funcionar. Chegámos às 14h20 e após algum tempo a conversarem com eles disseram que o problema residia no facto de que só estava um único soldado a trabalhar e que os outros que deveriam ter vindo não vieram trabalhar. Distribuiriam 80 fichas para serem atendidos desde o início da manhã até àquele momento só tinha sido atendidas 16 pessoas. A partir desse momento foi uma maratona delas com o telemóvel tiveram quase durante 4 horas (tempo que passámos no local) a telefonar. Isto veio verificar que realmente elas têm razão, há situações que o sistema desenvolvido não consegue ter nenhuma acção. Só os telefonemas é que geram acções mais ou menos imediatas. De tempos em tempos vinham explicar-me o que estavam fazer quais os problemas, etc. Havia pessoas que estavam ali desde as 3h00 da manhã para ganhar vez, algumas dessas nem sequer tinham sido ainda atendidas. Depois explicaram-me que o atendimento diário está atribuído a localidades, ou seja, cada indivíduo de cada localidade só tem aquele dia da semana para tentar tratar dos assuntos, caso não consiga, só na semana seguinte poderá lá ir. Havia pessoas que já era a terceira semana que estavam ali, já não podiam ir trabalhar à três semanas.
Todo o processo era bastante lento, e havia esquecimentos, propositados ou não, que originavam com que os indivíduos não tivessem o cartão electrónico válido. Desde situações como a de se esquecerem que retirar a impressão da palma da mão. E quando elas telefonavam para dentro para falar com o soldado, ele dizia-lhes que era azar, ele teria que voltar para a próxima semana para acabar o processo. Elas telefonavam ao comissário responsável e algum tempo depois o indivíduo estava a ser chamado para acabar o que faltava. Tudo isto demonstra uma falta de respeito pelas pessoas.
Das oitenta pessoas previstas, foram atendidas cerca de 30 a 40. As outras teriam que voltar para próxima semana. Ainda tentaram que pelo menos meia dúzia ainda fosse atendida mas após terem tido resposta positiva pelo comissário, passado algum tempo, e após novas tentativas para ele, para saber o porquê da demora, já não se encontrava disponível. Tivemos que vir embora porque os soldados fecharam o recinto e, ao jeito deles, pontapé das cadeiras e na porta, sim porque as mãos deles ainda não percebi bem para que é quer servem.
Não percebo nada de hebreu, mas apercebi-me algumas das conversas telefónicas foram bastantes agressivas, pelo tom de voz e pela disposição após do telefonema, por vezes diziam-me outras não. Saímos de lá cerca das 18h30.
Hoje não existem fotografias porque não se proporcionou, devido aos locais ou às situações. Por hoje é tudo, amanhã vou novamente cedo para Abu Dis.

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